Terminei de assistir ao filme “Medo” com a empolgação reduzida em relação à expectativa criada pelo meu imaginário. Confesso que fiquei um tanto consternado por não ter experimentado o impacto que parecia prometido. A palavra “medo” tem um poder quase universal, tocando a essência do ser humano e refletindo nossa própria humanidade. Sentir medo é natural, é um mecanismo de defesa que nos previne de diversas situações, mas também atua contra nós, afetando nossas ações e decisões em quase todos os aspectos da vida. O filme, por sua vez, se mostra errático em vários momentos, ao misturar elementos bíblicos com a história das bruxas do século XVII.
A história está centrada em traumas do passado dos personagens, que acaba sendo revelado de bandeja para o telespectador logo no início, em uma roda de fogueira (noturna, é claro), onde cada um expõe o que mais perturba desde sempre em seus íntimos. Pessoas passando por problemas profissionais e psicológicos, impulsionado por uma grande pandemia viral (foi gravado na época da pandemia global da COVID-19), em que um deles tem a brilhante ideia de convidar a todos a passar um final de semana de reclusão numa grande mansão no meio do nada. Construção antiga, que foi restaurada após um grande incêndio que destruiu o prédio original. E será nesse casarão de veraneio que um espírito maligno precisa se alimentar para continuar assombrando o espaço.
A “dona” da pensão é uma velha senhora que mais parece a Bruxa do 71 (não sei como tive coragem de trazer Chaves para a conversa – risos), que no ato de boas-vindas fez questão de fotografar o grupo de turistas para fazer valer a tradição do lugar. Foto instantânea registrada por uma câmera polaroid descolada, gostei desse recurso tecnológico usado pela anfitriã. E outra coisa que mostra o avanço temporal do lugar é o ótimo sinal de Wi-Fi (os espíritos medievais mostrando que não ficam pra trás!). Mas antes de sair de cena, a velha senhora presenteia a galera com uma garrafa de vinho, presente aceito de muito bom grado. A partir desse momento alguns fatos isolados começam a acontecer, bem de leve, mas que começa a levantar as primeiras suspeitas do lugar.
Os personagens começam a confrontar seus medos, sendo que ninguém aparenta perder o controle das ações, exceto quando são pegos desprevenidos, em sonhos (ou pesadelos), por exemplo. A vigilância pessoal começa a ponto de todos serem ludibriados por um medo em comum: da pandemia que assola o planeta. Todos são convencidos por uma notícia na TV de que um poderoso vírus surgiu e a transmissão se dá por meio do ar, ou seja, são obrigados a ficar trancafiados no casarão. Esse foi o “pulo do gato” do filme, um gatilho coletivo que encurralou todos, sem exceção. E a medida que o grupo começa a explorar a casa, vão descobrindo coisas bizarras e desconexas, o que nos permite a divagar sobre realidade e imaginação. Bom, posso dizer que agora o filme de fato “começou”.
Uma das personagens toma a difícil decisão de sair do casarão para encontrar com seu filho (escolha acertada – pequeno spoiler), superando o medo em comum que envolve o grupo. A partir desse momento ladeira abaixo para todos que decidiram permanecer nas dependências daquela mansão. A casa revela ser uma espécie de organismo vivo, ainda que de relance por meio de sombras, maçanetas “nervosas”, goteiras surgidas de repente, mudanças na arte de quadros na parede, entre outras esquisitices, que faz cada um sucumbir em paranoias, resultando em automutilações forjadas a partir da crença em seus medos. Demorou um pouco para eles entenderem que estavam sendo caçados por um espírito faminto.
É nesse ponto que a história das bruxas entra em cena, mas, para minha surpresa, foi mal explorada. A relação entre o baú de fotografias encontrado em um dos grandes porões do local e os demais objetos descobertos – todos supostamente ligados a um culto secreto que venerava energias negativas, sustentando a alta densidade daquele ambiente – não ficou clara. Além disso, uma passagem bíblica recitada em voz alta serve para materializar a “água benta”, que exorciza o espírito maligno que ameaça devorar a alma de todos os presentes. No entanto, essa solução careceu de elementos que realmente me convencessem. Esse processo, aliado à falta de coragem, sugere que o verdadeiro antídoto para os obstáculos enfrentados pelos personagens é esvaziar a mente dos pensamentos que alimentam o medo pessoal. Isso enfraquece o poder do espírito maligno e devolve a sanidade, restaurando o autocontrole.
Um terror psicológico que se aproveita de fraquezas mal resolvidas na cabeça das pessoas, assumindo o controle das ações delas, muito para promover uma confusão emocional que pode levar a consequências irreversíveis, e não estou falando somente do pior resultado, identificado no óbito, mas também de traumas permanentes que pode afetar uma vida inteira. Eu entendi a proposta do filme, só não fiquei confortável com a areia movediça teatral dos primeiros quarenta minutos, uma espécie de “aquecimento” desnecessário, que desidratou o meu interesse em vários momentos. A foto do grupo, registrada pela polaroid, recuperada em certo momento e que mostrava os personagens ceifados com um borrão foi o clichê mais barato que eu vi em toda trama, superou até o vinho barato de 1938 que a galera tomou pensando que era do garbo de um D.V. Catena (risos).
O filme “Medo” está disponível no serviço de streaming MAX e tem a classificação indicativa não recomendável para menores de 12 anos.
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Dados técnicos:
Nome original do filme: Fear.
Direção: Deon Taylor.
Roteiro: Deon Taylor e John Ferry.
Duração: 99 minutos (com abertura e créditos finais).
Procedência: Estados Unidos da América.
Ano de lançamento: 2023.
Disponível: MAX.
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