Pois bem, não imaginava que o meu retorno ao blog fosse para falar de filme, mas isso não é um problema, ao contrário, me sinto absolutamente à vontade dentro de assuntos cinematográficos. Longe de ser um especialista no tema, minha boa vontade com certas produções “contamina” uma crítica mais racional. Agora vamos aos fatos, o filme “100 Acres de Inferno”, na melhor tradução possível e longe da adaptação concedida para o público brasileiro, que sugere “Acampamento Maldito”, é daqueles trash que me fez lembrar os filmes que passava da Rede Bandeiras na década de 1990.
E aqui a crítica não é por ser ruim em si, isso é fácil de dizer e muito provavelmente nem merecesse um texto para fazê-lo. Vai muito mais além, e pretendo aqui “dissecar” as minhas impressões, sem receio dos tais spoilers, já que se trata de uma produção de 2019, bem distante de uma novidade ávida a ser explorada. Começando pela capa de divulgação, com quatro jovens usando máscaras sinistras e portando armas brancas. Não sei se eu dormi em algum momento, mas não vi esses tais mascarados no decorrer do filme, silhuetas sombrias sim, mas figuras mascaradas não! Vou considerar um easter egg mal feito que deu certo, já que despertou o meu interesse para ver o filme assim que bati o olho no catálogo do streaming do Looke.
Sobre a história, um ex-lutador de peso muito pesado (o cara é um trator humano) convive com uma perda familiar, além de mostrar limitações físicas decorrentes de que posso garantir ser resultado de anos recebendo pancadas. Está num bar, no melhor clichê possível, debruçado sobre o balcão de um ambiente vazio e "morrendo" aos poucos com uísque e remoendo às tristezas do passado. É claro que o nosso anti-herói Buck Severs têm amigos, mais do que isso, amigos da 5ª série (risos forçados). E esses rebentos de sabedoria inútil o convidam para um final de semana numa reserva florestal, regada à cerveja e conversas enfadonhas para autopromoção. Cada qual bem crescidinho e com suas vidas medíocres, sem tanta diferença dos tempos colegiais, exceto que agora existem os boletos!
A sensação de liberdade é tamanha que eles provocam até um grupo de motoqueiros na estrada, tentando revelar o pequeno poder da liberdade em percorrer alguns quilômetros para longe dos holofotes urbanos. Numa certa estalagem na estrada, compram carne e bebidas que só de olhar, já sinto o cheiro de esgoto aberto, não preciso ser empírico nessa questão, é gritante observar que o consumo daquelas “iguarias” seria pior que tomar óleo lubrificador no deserto (referência ao belíssimo “Quantum Of Solace”). E claro, no quarteto de amigos, sempre tem o mais “rico”, o “mulherengo depravado”, o mais “conciliador” que vai no embalo e o grande lutador, que precisa ser reconectado ao mundo.
De boas ações o inferno tá cheio, mas isso não é o bastante, um dos rapazes insiste numa história que remonta a uma lenda urbana em um desses locais inóspitos, só que não faz ideia de onde fica. Pedem ajuda aos residentes daquele cenário vintage, que relutam em dizer, mas acabam por fazê-lo, afinal o filme precisa prosseguir! A tal reserva selvagem “Foggy Creek” é um local de difícil acesso, lembrada por assassinatos e desaparecimentos de corpos. Mas os nossos bravos ginasiais quererem porque querem ir para lá desbravar os mistérios do lugar. Levam armas de caça, quem sabe algum alce aparece na mira e assim ganham mais pontos de irrelevância. Montam as barracas e um grupo local junta-se a eles para a famosa fogueira de fim de noite.
O grupo está sendo observado por uma figura sinistra, que porta consigo arco e flecha, a câmera tira o foco a medida que a silhueta se aproxima, só para dar o charme oitentista. Pouco a pouco os integrantes da roda vão sendo assassinados, de forma bem óbvia, ninguém ali parece se importar com isso, só esperam mesmo pelo desligamento formal do setor de Recursos Humanos. É aí que o roteiro mostra uma pobreza encefálica, as mortes passam longe de ser convincentes, é como se os atores tivessem encenando um trabalho de TCC para receber seus títulos. O tal lutador, que surge bebendo lá no início, é o único sóbrio do grupo, talvez tenha imposto a si uma espécie de “Lei Seca” para conseguir cumprir a missão de protagonizar o personagem de herói que tanto se espera dele.
O dia amanhece e o grupo está separado, um curando a ressaca, o outro desaparecido, os locais em destino ignorado, igualmente com as armas longas, daí rapidamente deduzem que foram roubados na calada da noite. Mal sabem que o destino foi muito mais ingrato, enfim, seguimos pelo caminho de obviedades. Os três amigos seguem para procurar o dono da ideia daquela viagem genial, mas são confrontados com armadilhas pelo caminho. Até que o nosso lutador encontra um trailer velho, mas com cara de que alguém mora ali. Pelo caminho um amontado de carros velhos, tipo aqueles ferro-velho abandonados, dessa cena eu gostei, receita de bolo que não falha! Nisso já havia escurecido novamente, impressionante como o relógio “corre” quando é para favorecer o predador local.
Dentro do trailer algumas mulheres amarradas, mantidas como reféns, além dos corpos dos que foram “retirados” de cena momentos antes. As mulheres são libertadas pelo lutador, que logo percebe a chegada do nosso sinistro vilão metido a Gerônimo. Só que aí eu fiquei decepcionado pela capacidade pueril de aniquilação de roteiro, já que o tal engodo em pele humana faz um movimento fora do trailer meio que “convidando” o lutador para resolver a questão no braço, literalmente! E o metido a Chefe Apache tira a máscara e o manto de trapos para mostrar que seria uma luta igual, sem trapaças. Ora, um louco desvairado que tem um prazer bizarro em ceifar vidas propondo um combate “limpo”, o que quer que eu pense?! O mundo acabou mesmo, só esqueceram de me avisar! É como se o primo distante do Jason Voorhees fosse um admirador de lutas de boxe e quisesse se provar naquele cemitério de almas desavisadas.
Mas o final eu não conto! O filme acabou e eu fiquei tão convicto de vir aqui escrever, que já estou na terceira página de Times New Roman 12 e ainda assim fico me perguntando se todo esse esforço mental que tive não poderia ser empregado em outra atividade, como, por exemplo, plantar uma árvore (risos). No final das contas o plano de me entreter foi alcançado (mesmo com a péssima fórmula escolhida) e o filme, que foi tão tosco a ponto de me causar comichão, trouxe essa sinergia improvável de indignação com certo acolhimento ao menos para tentar captar curiosos em querer assistir. O Cine Trash ainda existe!
Daniel Gonçalves, além de entusiasta de rock, apaixonado em ser surpreendido pelo universo cinematográfico (lados B e C me “fascinam”).
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